sexta-feira, novembro 30, 2007

Entre pontes, plásticos e papéis

Mais uma vez estou aqui. Não sei quando isso acontece. Em um momento estou deitado e no outro estou andando sobre essas pontes. Embaixo corre um rio de água preta e fétida. Uma mistura de lama com centenas de garrafas, sacos plásticos, latas e coisas em decomposição. À frente vejo uma criança de uns três anos. Ela está com a boca suja e lambuzada, mas não é por causa de um doce e sim porque estava chorando. Sua mãe nem se importou em limpá-la. A mãe é nova, mas parece ter dez anos a mais. Usa apenas o suficiente para cobrir seus seios. Um cara sem camisa e com tatuagens que parecem ter sido feitas com caneta azul aparece. Ele dá um sorriso falso pra mim, como quem recebe para uma visita. “E aí meu chegado?”. A maioria dos dentes podre e o restante estragado. Está sempre com medo. Eu não deveria estar aqui. Aqui não é o lugar dos jovens engraçados que falam bobagens e das meninas sorridentes e de cabelos cheirosos. Se a maioria tivesse que vir aqui desistiria ali na entrada. Isso não é um filme e não é massa estar aqui.

Lembro do inicio aonde eu fazia questão de não esconder de ninguém. Era mais uma virtude do que um costume. Agora tento ser o mais discreto que posso. Já tive amigos que não se deram bem entrando no lugar que estou. “Tu tens sorte em nunca ter te acontecido nada porque comigo já aconteceram várias vezes” disse um amigo meu. Eu nunca passei por esse pânico. Imagino que se um dia acontecer as coisas podem mudar. O tolo é aquele que aprende com seus erros e o sábio é aquele que aprende com o erro dos outros. Ainda não me preocupo em deixar minhas coisas em um lugar seguro antes de vir. Nem ao menos tiro o meu chapéu e todo o meu dinheiro ainda continua no bolso. Que pessoa tola que sou. Existe um ciclo aonde quem tem coragem de vir pode ficar sem gastar dinheiro. “È para compensar os riscos”. As vezes sobra uma vaga para quem possui um local também. Abri mão disso e misturas improvisadas com material que corrói até automóveis já não fazem a minha cabeça há mais de um ano.

Eu não preciso mais deste lugar. Quero dar meia volta. Como é bom estar na aurora da juventude. Vejo jovens com menos de 20. Eles me parecem tão cheios de potencial e novas idéias. Só se passaram cinco anos para mim. Quando aparecia alguém novo era aquele processo de batizado e algumas técnicas eram repassadas. Lembro quando passei por isso. Foram muitos momentos de encanto. Parecia uma brincadeirinha. Lembro das meninas que hoje são da Old School. Elas pareciam tão felizes. Hoje existem calouros da época que estão mais atuantes que eu. É o que chamaríamos de empolgados. Uma espécie de vício psicológico. Em parte do dia estão com o pensamento enterrado na lama dessas pontes, embaixo de uma lata e cobertos com um saco plástico. Eu não.